Camisa vermelha da Seleção é ato mercadológico e não político, por Lilian Carvalho*
![]() |
Foto meramente ilustrativa. |
Ainda é muito cedo para afirmarmos se a polêmica
“camisa vermelha” da Seleção Brasileira terá impacto positivo ou negativo em
termos mercadológicos ou, até mesmo, na relação com o torcedor. Afinal, só em
2026 saberemos se, de fato, a Nike colocará em prática o novo modelo como
uniforme reserva – no lugar da camisa azul – e como será a aceitação. Segundo o
software Buzzmonitor, durante o dia 28 de abril, no auge das discussões sobre o
tema, a maioria das menções foram neutras (45,52%). Outros 30,7% corresponderam
às menções positivas e 22,4% às menções negativas.
Há um burburinho na Internet sobre a motivação para
a mudança ser política, já que a camiseta verde e amarela foi utilizada nos
protestos pelo impeachment da então presidente Dilma Rousseff, em seu segundo
mandato, e se tornou símbolo do bolsonarismo. Por esta razão, essa seria uma
estratégia do atual Governo de "retomar" um símbolo nacional para si.
Mas nenhuma declaração da Nike nem da CBF corroboram essa especulação e, sendo
bem honesta, o mais provável é que não seja.
Quem acreditaria que a Nike, um dos símbolos do
capitalismo e da força econômica norte-americana, estaria alinhada a um
capricho simbólico dessa natureza? Aqui, preciso relembrar o óbvio: esse tipo
de estratégia tem como foco principal o lucro. Caso contrário, a fornecedora de
material esportivo já teria tomado providências “anti-apropriação política” nas
edições passadas da Copa do Mundo.
Mas por mais vazia que essa polêmica pareça ser, ela
carrega alguns pontos interessantes a serem considerados nessa discussão.
Um dos principais é: a tradicional camisa
predominantemente amarela é, sem dúvidas, o maior símbolo da Seleção Brasileira,
apelidada de Canarinho. E vou além, ela talvez seja o símbolo máximo do futebol
arte em todo o mundo. No linguajar dos “boleiros”, a camisa mais pesada! E sim,
ela continuará sendo parte do uniforme titular, acompanhada do verde, azul e
branco.
A tão comentada “apropriação” da peça em
manifestações políticas de direita, no Brasil, de fato causou aversão em
pessoas alinhadas à esquerda em usá-la, nos últimos anos. Isso, porém, não
afastou os progressistas que gostam de futebol e torcem pela Seleção. Afinal, a
também tradicional camisa azul, destaque no primeiro título mundial, em 1928,
sempre se mostrou uma alternativa instantânea.
Para além disso, parte da esquerda não tão avessa ao
lucro foi além: réplicas não oficiais da camisa da Seleção Brasileira, na cor
vermelha, com o emblema da CBF e tudo, começaram a ser fabricadas e vendidas
aos montes. Pronto, resolvido o problema, mesmo que de forma não autorizada
pela Nike ou pelo alto comando do futebol brasileiro. Ninguém deixou de torcer
nas Copas de 2018 e 2022.
Esse fato, aliás, também pode ter algum peso nesse
movimento da Nike. Sabendo do impacto negativo nas vendas que as versões
esquerdistas piratas podem causar, por que não ela mesma explorar a cor
vermelha e, mesmo que sem viés político, oferecer uma alternativa oficial aos
torcedores mais incomodados? De novo, entra o lucro, e não a política.
Ainda assim, outros aspectos me fazem acreditar no
interesse único e exclusivamente mercadológico da empresa. Segundo a Nike, essa
mudança é um esforço de apresentar a marca Jordan, inspirada no ex-jogador de
basquete norte-americano, Michael Jordan, para o mercado brasileiro. Chamamos
essa estratégia de GtM – “Go to market” ou “penetração de mercado”.
Além disso, sabemos como o “diferente” é atrativo
comercialmente. Dentro do futebol, já é uma prática comum, inclusive em clubes
ligados à própria Nike, o lançamento de uniformes reservas com cores
alternativas e layouts “diferentões”, mesmo que não tenham ligação com a
história dessas equipes ou torcidas. Pegando um exemplo não tão recente, lá em
2010 o Clube Atlético Mineiro, que possui adeptos tão apegados ao preto e ao
branco, resolveu lançar uma camisa de treino na cor rosa. Inicialmente, a
reação majoritária da torcida foi negativa, enquanto os rivais levaram para o
lado da zoação. O motivo claro, nos dois casos, era a resistência do meio do
futebol, tão ligado à ideia da “macheza”, ao tom tradicionalmente ligado às
mulheres. No fim das contas, a camisa foi um sucesso de vendas e,
posteriormente, outros clubes fizeram o mesmo.
No caso atual, envolvendo a Seleção Brasileira,
evidentemente que entre o público consumidor, de forma reativa, haverá sim a
politização na hora de comprar. A direita “patriota”, provavelmente, seguirá
com a camisa amarela, enquanto os mais sensíveis da esquerda terão uma
alternativa oficial para “não ser confundido”. A única certeza que posso dar é
que a vitória, de goleada, será da Nike.
* Lilian Carvalho é
PhD em Marketing e coordenadora do Centro de Estudos em Marketing Digital
da FGV/EAESP
Agradecimentos: Caíque Rocha |
Compliance Comunicação
** Este conteúdo foi enviado pela assessoria de imprensa
Comentários
Postar um comentário